O DNA das leis
A justiça é a vingança do homem em sociedade, como a vingança é a justiça do homem em estado selvagem. Epicuro
A cegonha das leis
Onde nascem as leis, como elas são criadas?
Observando, vemos que as leis vão se adaptando, mudando, mas por quê? Elas já não deveriam ter encontrado suas descrições definitivas, já não deveriam estar no “estado da arte” em termos de definições?
Vejo alguns motivos para tantas leis e suas mudanças.
Primeiro, o mundo é dinâmico, as culturas evoluem, novas dúvidas aparecem conforme evoluímos como sociedade.
Segundo, se não fosse assim como os legislativos justificariam sua importância num mundo onde todos querem manter o seu emprego.
Terceiro, as leis são feitas por quem tem o poder e na troca de grupos dominantes junto se vão as leis dos perdedores e vem as dos ganhadores.
Mas o ponto que quero chegar é:
-Onde estão as leis supremas que uma vez redigida nunca mais serão mudadas?
Poderíamos pensar no “Mundo das Ideias” de Platão. Onde existe um lugar que agrega as definições de tudo, como se fosse uma enorme biblioteca com todas as descrições, um local com a matriz, molde, de todos os conceitos e eles são verdadeiros, eternos e imutáveis. Mas quem tem acesso a isso, quem tem a chave desse local?
Entrelinhas
As leis têm uma linguagem pomposa e não parece ser para realçar a sua nobreza e sim distanciá-la e resguardá-la das pessoas comuns. Mantê-la sob a guarda de uma elite.
Algumas religiões têm mandamentos, regras e leis, algumas descritas claramente, outras em parábolas e a maioria nas entrelinhas de textos.
As leis são diferentes entre países e estados e mesmo as bem descritas podem ser interpretadas a bel prazer de um juiz de capa e ego reluzentes.
As leis da natureza
Saindo do Mundo das Ideias, vamos pensar em leis mais concretas e definitivas, isso existe? Sim, as leis da física e química, ou as leis da natureza.
Existe um software chamado CAE, parente do CAD e CAM, Computer Aided Engineering ou Computador Auxiliando na Engenharia. Esses programas se propõem a simular as reações de materiais diante de forças; Ex: Qual o peso que essa cadeira suporta? Qual a penetração aerodinâmica desse carro?
Para o cálculo dessas reações é necessário um número muito grande de parâmetros a serem analisados: características dos materiais, formato da peça, intensidade e direção das forças atuantes.
Por que estou falando disso? É que sempre imaginei o mundo assim, continuamente estamos diante de muitos cálculos. A cada toque dos meus dedos no teclado existe a análise de diversos parâmetros em um imenso computador dizendo que a pressão dos meus dedos foi suficiente para movimentar a tecla e passar o limite, ou ponto de corte, (novo texto que estou maturando), que diz para o computador desenhar uma letra na tela e não, quebrar a tecla ou o meu dedo.
Baseado nisso, imagino que cada material tem impresso no seu “DNA”, (isso é só uma metáfora tá?), as suas características físico/químicas para responder sempre do mesmo modo a forças externas num eterno estado de ações e reações idênticas, fazendo assim que essas leis, da natureza, sejam definitivas, mesmo diante de infinitas interações com materiais e forças.
O que chamamos de leis da natureza, de Newton, da gravidade, são baseadas no que conhecemos, nas experimentações conhecidas nesse nosso ambiente terreno e até onde um acelerador de partículas consegue ir hoje.
Então, a natureza tem suas leis, elas não estão descritas, nós é que tentamos interpretar e descrevê-las. Elas não mudam, nós é que podemos interpretá-las erroneamente e depois corrigir a nossa descrição. Elas são impiedosas, ninguém consegue burlá-las.
O futuro das leis
Concluindo as minhas dúvidas, por que no mundo das ideias, de poderes, de subjetividades das palavras, aparentemente nunca teremos as leis ideais? Nunca atingiremos o DNA da constituição, no sentido republicano. E por que no mundo físico/químico sempre temos certezas de ter atingido o conhecimento correto de como as coisas funcionam?
Aparentemente observamos a natureza, vemos um comportamento, simulamos diversas vezes, experimentamos variações e vemos comportamentos repetidos. A partir daí aceitamos esse conjunto de respostas a estímulos e agrega-se um novo parágrafo as outras leis já conhecidas.
As leis humanas são criadas de acordo com interesses particulares, de bancadas, de classes e de grupos políticos e são alteradas conforme outros interesses diante de novos cenários. Quando criadas também são deixadas muitas “entrelinhas”, afinal temos que empregar advogados e dar autonomia e poder para o judiciário, que muitas vezes julga os personagens e não suas ações (para um lado ou para outro) deixando claro que não existe um portador da chave da grande biblioteca universal de leis.
Alguns preveem softwares “juízes” algo como “CAJ” (Yuval Harari), Computador Auxiliando Julgamentos. Imputa-se os dados da acusação e do réu e baseado nas leis vigentes sai a sentença. Acho difícil, ainda mais em países onde se avalia mais as pessoas envolvidas do que o delito, mas o futuro não é só amanhã ou alguns anos, o futuro comporta séculos e milênios.
PS. Este texto foi inspirado a partir de um post meu de 2018, época que Inteligência Artificial não era uma realidade para nós mortais. Hoje a IA já é utilizada por advogados para gerar alguns documentos. Não me aventurei, ainda, a imaginar seu impacto na criação, depuração, eliminação de leis, muito menos na aplicação das leis e julgamentos.